Qual o regime de bens ideal para o meu casamento?
Por debaixo do véu de romantismo e realização que envolve o casamento com a pessoa amada, existe uma dose fundamental de pé no chão e planejamento. Calma, não estamos sendo pessimistas! Morar debaixo do mesmo teto requer organização e divisão de tudo, certo? Então, assim como fazer supermercado, arrumar casa e levar o filho para a escola são atividades que precisam se encaixar e ser encaixadas na realidade dos dois cônjuges, a divisão dos bens também deve! Dinheiro, patrimônio, dívidas, investimentos, o que entra, o que sai, o que fica, o que já era seu ou dele(a) antes de se casarem, etc. Por isso, escolher bem o regime de bens é um momento crucial!
É importante pensar que, uma vez unidos, todas as buscas e rotinas de um influenciam nas buscas e rotinas do outro. Antes de fechar um negócio ou de aceitar um emprego, é fundamental considerar o que aquela decisão acarreta no planejamento de vida pessoal e profissional do companheiro(a). E assim, juntos, vocês vão dividindo sonhos e construindo uma história. E mesmo que pareça racional demais, é importante definir direitinho qual o pedaço de cada um nela.
Conheça os quatro tipos de regime de bens existentes no Brasil:
1) Comunhão parcial de bens: é o regime adotado automaticamente caso o casal não realize pacto pré-nupcial. Determina que todos os bens adquiridos a partir da realização do casamento são de posse do casal igualmente, independente no nome de quem tenha sido registrado. No caso de morte de um dos cônjuges, o outro herda metade dos bens adquiridos durante o casamento. A outra metade será dividida entre os filhos. Aquilo que o cônjuge falecido adquiriu antes de se casar será dividido igualmente entre o cônjuge sobrevivente e os descendentes.
Não entram na partilha bens de uso e necessidade pessoal, como telefone, livros, roupas e computador, bem como instrumentos de uso profissional. Jóias, carros e objetos de valor são partilháveis assim como aluguéis, rendas e juros de capital aplicado. Bens oriundos de herança e doação, destinados a somente uma das partes, não são considerados na divisão, ainda que o fato tenha se dado durante o casamento, a não ser que sejam vendidos – nesse caso, o valor resultante integra patrimônio comum. Não há comunhão no caso de direitos autorais. Bens adquiridos por um dos cônjuges de forma ilícita também não se estende ao outro na partilha, a não ser que tenha gerado proveito para o casal. Há precedentes no STJ que consideram entrarem na partilha verbas referentes a processos trabalhistas de uma das partes, desde que tenham sido pleiteadas durante o casamento. Não há consenso sobre o FGTS e nem sobre os planos de previdência privada.
2) Comunhão universal de bens: determina que todos os bens são comuns ao casal, mesmo aqueles adquiridos antes do casamento. Excetuam-se os seguintes casos:
•Doação ou herança com cláusula de incomunicabilidade: essa cláusula de incomunicabilidade determina que herança ou doação aferidos concedidos a um dos cônjuges não possa ser divididos ou transferidos.
•Bens com fideicomisso: situação que estipula a sucessão da transferência de bens para herdeiros – como em um caso em que o imóvel passa para o filho que, dele deve passar para o próprio filho e assim por diante. Deve ser registrado em testamento.
•Dívidas anteriores, sem proveito comum: caso uma das partes tenha contraído uma dívida antes do casamento, a responsabilidade de quitá-la permanece sendo apenas dele, mesmo durante o casamento.
•Doação entre cônjuges com cláusula de incomunicabilidade: permite que um cônjuge faça uma doação para o outro, garantindo que este não será compartilhado com terceiros;
•Bens de uso pessoal e profissional também não entram na partilha, assim como bens adquiridos por ato ilícito.
3) Separação total de bens: determina que o que foi adquirido antes ou durante o casamento continue sendo de propriedade individual de cada um. Segundo o artigo 1641 do Código Civil, menores de 18 anos e maiores de 70 devem se casar nesse regime. No caso dos menores de 18, o regime pode ser alterado quando atingida a maioridade. Caso um dos cônjuges venha a falecer durante a vigência do casamento, o sobrevivente pode dividir a herança com os filhos e, no caso de casal sem filhos, com os pais do falecido.
4) Participação final nos aquestos: aquestos são os bens adquiridos durante o casamento. Nesse regime, o que pertencer a cada um antes do casamento continua sendo privado, mesmo com o divórcio. O que for adquirido por cada cônjuge durante o casamento é considerado de posse particular, podendo ser até negociado. Porém, se o casal se divorciar, deve ser realizada uma apuração contábil e os aquestos divididos igualmente, independente da ascensão patrimonial e financeira de um ou outra parte durante o casamento.
O regime de bens só pode ser alterado após o casamento sob a concordância dos dois cônjuges.
Pacto pré-nupcial
Independentemente do regime de bens eleito, é fundamental ressaltar a importância do pacto pré-nupcial. Esse pacto deve ser feito em um Cartório de Notas e levado ao Cartório de Registro Civil onde será realizado o casamento. Opera como um contrato em que os noivos estipulam direitos, deveres e procedimentos gerais referentes a patrimônio no caso de divórcio, morte ou quaisquer eventos. Pode funcionar como um regime personalizado de bens, considerando questões particulares ao casal. Caso o pacto pré-nupcial não seja formalizado, irá prevalecer o regime de comunhão parcial de bens.
União estável
Por muito tempo ignorada, a união estável é uma opção de constituição familiar que a cada dia mais avança na conquista de direitos. E apesar de várias diferenças com o casamento, também possibilita regime de bens como o estatuto patrimonial do casal. Portanto, antes de solicitar uma certidão em um cartório, o casal pode definir seu próprio regime de bens. Se não o fizer, a discussão pode ser aberta judicialmente, em caso de separação. A maioria dos juízes costuma considerar em casos de união estável a separação total de bens. Porém, o ideal é que o casal especifique o modelo. Sentenças que venham a decidir por arranjos como comunhão universal de bens, ou mesmo separação total de bens, podem ser extremamente injustas para uma das partes.
Concubinato
Não são raros os casos em que amantes passam tanto tempo juntos, que chegam a construir patrimônio, dividir bens e realizar colaborações e investimentos de ordem material e financeira, mesmo estando uma das partes casada formalmente. Para situações extra-conjugais existe a súmula 380, do STF, que afirma: “Comprovada a existência de sociedade de fato entre os concubinos, é cabível a sua dissolução judicial, com a partilha do patrimônio adquirido pelo esforço comum”. Tal visão é complementada pela súmula 382, que determina que “A vida em comum sob o mesmo teto, “more uxorio” (morar junto), não é indispensável à caracterização do concubinato”. Para esclarecer confusões recorrentes, o concubinato, ao contrário da união estável, configura relação clandestina em que uma das partes mantenha casamento civil com outra pessoa.
Ainda que o direito avance e tente contemplar a diversas peculiaridades, cada casal tem sua história particular e deve escolher o melhor caminho. Se informar e dialogar sobre o regime de bens ideal é decisivo. Amor e confiança não anulam responsabilidade e planejamento. Pensar com cuidado em cada passo ao lado da pessoa que você escolheu para compartilhar a vida pode tornar a união ainda mais verdadeira.
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